(Artigo original feito por Gabriel Goncalves Neto no mes de agosto de 2005 as vesperas de um casamento em Uberaba, M.G.)
Ver também o artigo da Guerra do Paraguai no Wikipedia.
José Emerenciano de Andrade, meu bisavô, foi casado com Ambrosina. Teve 4 filhos; 2 antes da Guerra do Paraguai (1864-1870) o Manoel Andrade (Neca Andrade, político, delegado de policia), e a Rita. Depois da guerra nasceram mais 2: o Adolfo e a Cota. A guerra durou 6 anos e foi incentivada pela Inglaterra e pela Alemanha que queriam criar um pais grande entre o Brasil e a Argentina. José Emerenciano foi fornecedor de mercadorias para as tropas do governo imperial brasileiro. Ele tinha uma tropa de burros para levar arroz, feijão e carne seca para a guerra. Em recompensa pelos serviços prestados D.Pedro II lhe deu 6 sesmarias que iam do Prata, MG (município onde minha mãe foi registrada ao nascer) até as barrancas do Rio do Peixe (+/- 100km por 50km). A maior cidade vizinha das terras chama-se Veríssimo, no estado de Minas Gerais.
Emerenciano montou fazendas e a sede dele construída em 1915 chamou-se Fazenda das Primas. Quando ele morreu a sede ficou para a viúva Ambrosina. Ela separou um pedaço pequeno das suas terras e doou para a Igreja, daí surgiu a cidadezinha Patrimônio do Rio do Peixe, que existe até hoje. Quando Ambrosina faleceu a sede ficou para a filha Cota, casada com o Franklin.
Meu avo Adolfo Andrade nasceu na segunda leva depois da guerra do Paraguai. Era baixinho e extremamente hábil com dinheiro. Casou com a Theodora Oliveira quando ela tinha 14 anos. Tiveram 8 filhos dos quais 6 atingiram a maioridade. Adolfo Andrade tinha a Fazenda Canhambola, onde construiu uma casa sede no mesmo período, por volta de 1917. Alem do Canhambola tinha as fazendas Cabaçal, Aprazivel e Onça. Todas contíguas.
Adolfo Andrade morreu com 40 anos de idade de pneumonia e deixou a viúva Theodora de 34 anos, brava como uma cascavel. O Franklin ficou viúvo da Cota (filha de Emerenciano e Ambrosina) e fez de tudo para casar com a avó Theodora, mas a velha foi irredutível; “ninguém pode substituir o Adolfo”, ela dizia.
Adolfo Andrade queria ser banqueiro. Tinha dinheiro emprestado para muita gente. Quando ficou viúva, minha avó Theodora mandou o irmão mais velho (Ardelino) cobrar. Ele ficou com metade do dinheiro. Por incrível que pareça continuaram amigos até o fim da vida. Será que ela sabia? Acredito que sabia. Comprou proteção. Apesar da fama e dos jagunços (pistoleiros) que tinha, a moral da época não favorecia uma mulher independente.
Minha mãe Carmita nasceu na Fazenda Canhambola. Os irmãos dela eram o Mauro, a Lygia, a Myra, a Malba e o Adolfo. Tia Myra contou que um dos filhos do Ardelino, irmão da avó Theodora era o Yolando, que quando adolescente estava totalmente apaixonado pela Carmita, minha mãe. Ele teve uma doença e morreu. Carmita foi ao enterro e ficou triste por muito tempo.
Quando os filhos da Theodora foram se casando, ela deu um pedaço da fazenda para cada um, com bois no pasto e bastante dinheiro no banco. O filho homem mais novo, José Adolfo de Oliveira Andrade, ficou com a sede da fazenda. Theodora ficou com a Fazenda da Onça que por muitos anos foi alugada pelo filho Adolfo. Houve algumas reclamações de que Theodora protegia o Adolfo. E na sua maneira típica ela respondia: “o dinheiro é meu; faço com ele o que eu quiser“.
Então em 1931 Theodora e filhos se mudaram para SP. Tinha 12.000 vacas e muito dinheiro no banco. Quando se mudou, Theodora comprou um terreno da Cia. City no bairro de Higienópolis para construir sua casa. Contratou um arquiteto famoso e um francês (Monsieur Ponchon) que trabalhava na Cia. City foi o decorador. Ele mandou fazer os moveis no Liceu de Artes e Ofícios, comprou tapetes persas, comprou os quadros.
Na Revolução Constitucionalista de 1932 minha avó ficou sem dinheiro, pois os bancos estavam fechados. Tio Mauro contatou um amigo aventureiro que atravessou o Rio Grande a nado e trouxe dinheiro para sua mãe.
Dna. Theodora, como era chamada por todos, tinha 12 irmãos. Todos atingiram 80 anos ou mais, sem nenhum ter morrido. E então, num breve período de tempo, todos morreram. Ela era a irmã rica. E como naqueles tempos escola boa era difícil fora de SP, uma infinidade de sobrinhos morou na casa dela da Rua Avaré, 244 em Higienópolis (ainda existe), enquanto estudavam em SP. Os netos em sua maioria foram para colégios internos. Mas um neto, Paulo, filho da Lygia, morou muitos anos na casa dela até terminar a faculdade. E como naqueles tempos era preciso alguém acompanhar os namoros, eu fui muitas vezes “vela” (chaperone) do Paulo.
Dna Theodora era vizinha de parede de Dna Sebastiana Cunha Bueno, mãe da Renata Mellão, casada com o Sergio Mellão. Um pouco acima, do outro lado da rua morava o João Veríssimo que ainda não tinha ficado rico e vendia goiabada que a mulher fazia em casa. Muitos anos depois, e sem saber desta historia fui companheiro do João Verissimo no Rotary Clube de SP. Ele era então muito rico, atacadista de alimentos, e estava começando a abrir a rede Eldorado de supermercados.
Os pais da noiva, Reginaldo e Ana Maria são ambos bisnetos do Emerenciano. Faz poucos anos o Reginaldo e Ana Maria adquiriram a velha sede da Fazenda das Primas, que tinha sido dos avós dele; estava totalmente abandonada; refizeram tudo; decoraram tudo.
Visitei a casa da Theodora de Uberaba (ainda existe) na Rua São Sebastião, 13. Apesar da mudança para SP ela sempre teve casa em Uberaba. É incrível a força de vontade, a garra dessa mulher; se mudando do meio do mato para uma SP que iria explodir em tamanho se tornando uma das maiores cidades do mundo.
PS. Fazia 15 anos que eu não ia a Uberaba. Com o casamento da Paula, filha dos primos Reginaldo e Ana Maria Andrade Cunha estive lá e resolvi colocar estas memórias no papel.
Gabriel Gonçalves N agosto de 2005
July 16, 2009 | Gabriel Gonçalves N
Gustavo, e' muito bom saber um pouco da historia da familia. Tanta coisa aconteceu, coisas boas e aquelas que se gostaria de esconder sob o tapete. Mas a historia e' assim mesmo. E a D. Theodora era uma senhora admiravel. Fico feliz de te-la conhecido.
Ana Maria Goncalves
July 16, 2009 | Ana Maria Goncalves